segunda-feira, 1 de agosto de 2022

VNI em pacientes com AIDS E IRpA tipo I


A epidemia da infecção pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV) representa fenômeno global, dinâmico e instável. Dentre as complicações mais comuns em pacientes imunossuprimidos, as infecções respiratórias são atualmente, o principal fator de risco para o desenvolvimento de pneumonia por Pneumocystis Jiroveci (PCP) ou pneumocistose. Dentre as principais alterações fisiopatológicas nesses pacientes encontramos: hipoxemia com aumento do gradiente alvéolo-arterial de oxigênio e alcalose respiratória, redução da capacidade de difusão sugerindo bloqueio alvéolo-capilar, alteração na complacência pulmonar, na capacidade vital, bem como na capacidade pulmonar total, sendo muitas vezes necessário o uso de ventilação mecânica (VM) invasiva para correção da fisiopatologia, melhora da dispneia e redução do trabalho respiratório nos casos com grave deterioração das trocas gasosas. Cerca de 40% dos pacientes com SIDA tem o pulmão como local principal para doenças letais e hipoxemia é comum naqueles doentes. 

Evitar intubação orotraqueal em pacientes imunossuprimidos deve ser um importante objetivo no tratamento da insuficiência respiratória e a utilização da VNI pode ser benéfica no alcance desse objetivo. Richard et al, em seu estudo, utilizaram CPAP por máscara facial em portadores de SIDA com diagnóstico de pneumonia por Pneumocystis Jirovesi apresentando hipoxemia (N=18). Foi realizado o tratamento com duração média de quatro dias. A mortalidade hospitalar foi de 55% juntamente com algumas complicações, tais como: pneumotórax e intubação orotraqueal. Ainda assim os autores concluíram que o CPAP é uma alternativa que necessita ser mais bem estudada para esse perfil de pacientes¹³. Já Miller et al, em seu estudo, aplicaram CPAP também por máscara facial em oito pacientes, com obtenção de sucesso, sendo que em sete dos pacientes, houve diminuição da frequência respiratória e melhora da oxigenação arterial diminuindo o número de intubação.

Já Confalonieri et al, em estudo prospectivo do tipo caso controle, compararam 24 pacientes tratados com VNI com outros 24 tratados com VMI e demonstraram com seus resultados que o uso da VNI evitou em 67% a necessidade de intubação. Já Hilbert et al utilizou a comparação entre o uso precoce e intermitente de VNI com o tratamento convencional, incluindo suplementação de oxigênio, em 52 pacientes imunossuprimidos, sendo dois com SIDA e a maioria transplantados medulares, com insuficiência respiratória aguda, infiltrados pulmonares e febre. No grupo submetido à VNI houve menor necessidade de intubação (12% vs.20%).

O III Consenso Brasileiro de Ventilação Mecânica traz como grau de recomendação B, o uso de VNI em grupos diferentes de imunossuprimidos, sendo um deles composto por pacientes com SIDA e insuficiência respiratória tipo I.  Hill, MD et al, apresentou em seu estudo publicado no ano de 2007, como sendo grau de evidência A o uso de VNI em pacientes imunocomprometidos. Anjos et al, realizaram, no ano 2012, um estudo prospectivo, composto por 30 pacientes portadores de SIDA com insuficiência respiratória grave que foram tratados com VNI no modo BINIVEL divididos em seis grupos. Os pacientes imediatamente após coleta de dados recebiam suporte respiratório não invasivo, iniciando com uma PEEP de 0 cmH2O e pressão de suporte (PSV) de 5 cm H2O e FIO2 de 1 durante 20 min. Durante esse tempo eram aleatoriamente direcionados a um dos seis e então, cada um recebeu uma sequência diferente de (5, 10, e 15; ou 5, 15 e 10; ou 10, 15, e 5; ou 10, 5, e 15; ou 15, 10, e 5; ou 15, 5, e 10 cm de H2O). Cada valor de PEEP foi aplicado durante 20 min. Nos intervalos de cada aplicação de PEEP foi realizada uma lavagem de 20 min, com máscara de Venturi com FIO2 de 0,5. A cada intervalo eram coletados novos dados. Os resultados deste estudo demonstraram que o uso não invasivo de PEEP foi associado à melhoras na oxigenação do sangue, sensação subjetiva de dispneia e frequência cardíaca, sendo que o uso de PSV com uma PEEP de 0 cmH2O acentuou relatos de sensação subjetiva de dispneia. 

O uso da VNI neste grupo de pacientes ainda é algo obscuro, visto que o acometimento pulmonar poderá ser muito grave a hipoxêmia refratária ao tratamento, porém quando bem selecionado e com uma amplo experiência a equipe consegue evitar a intubação e diminuir a mortalidade neste grupo.


Conteúdos:
  • Brito AM, Castilho EA, Szwarcwald. AIDS  e infecção pelo HIV no Brasil: uma epidemia multifacetada. Rev  Soc Bras Med Trop.2001;34(2): 2007-2017.
  • Barreto S. Pneumonia por “Pneumocystis carinii”: tratar ou investigar? Jornal de Pneumologia, 1997, 23 (2): 57 [editorial]. 
  • Marchiori E, Pereira CIGS, Moreira LBM, Capone D, de Moraes HP.Pneumocistose na Síndrome da Imunodeficiência Adquirida: Correlação da Tomografia Computadorizada de Alta Resolução com a Anatomopatologia. Radiol Bras 2001;34(6):317–321. 
  • Anjos CFD ; Schettino  GPP, Park  M, Souza  VS, Scalabrini Neto  A. A Randomized Trial of Noninvasive Positive End Expiratory Pressure in Patients With Acquired Immune Deficiency Syndrome and Hypoxemic Respiratory Failure. Respir Care 2012;57(2): 211–220. 
  • Carneiro EM, Maneira RZ, Rocha E. Ventilação Mecânica Não-Invasiva em Paciente com Provável Pneumonia por Pneumocystis Jirovecii. Relato de Caso. Rev Bras de Ter Intens,2008:20(2):210-212. 
  • Gachot B, Clair B, Wolff M, Régnier B, Vachon F. Continuous positive airway by face mask or mechanical ventilation in patients with human immunodeficiency vírus infection and severe Pneumocystis carinii pneumonia.Intensive Care 1992,18(3): 155-159. 
  • Antonelli M, Pennisi MA, Conti G. New advances in the use of noninvasive ventilation for acute hypoxaemic respiratory failure. Eur Respir J 2003; 22: Suppl. 42, 65s–71s.
  • Confalonieri M, Calderini E, Terrraciano S, Chidini G, Celeste E, Puccio G, et al. Noninvasive ventilation for treating acute respiratory failure in AIDS patients with Pneumocystis carinii pneumonia. Intens Care Med, 2002; 28(9): 1233-8. 
  • Hilbert G, Gruson D, Vargas F, Vlentino R, Gbikpi-Benissan G, Dupon M, et al. Noninvasive ventilation in imunosuprpressed patients with pulmonar infiltrates, fever, and acute respirtory failure. N Engl Med;2001: 344(7)481-487. 
  • SCHETTINO G. IIIº Consenso Brasileiro de Ventilação Mecânica. J Bras Pneumol, 2007, 33(Supl. 2): S92-S105. 
  • Jose A, Oliveira JRC, Dias ECP, Fuin DB, Leite LG, Guerra GS, et al. Ventilação Mecânica Não-Invasiva Aplicada em Pacientes com Insuficiência Respiratória Aguda após Extubação Traqueal. Rev Bras Ter Intens, 2006;18(4): 338-343. 
  • RICHARD W, BRUCE C, FRIEDMAN M. Continuous positive airway pressure by face mask in Pneumocystis carinii pneumonia. Crit Care Med, 1990, 19(1):21-24. 
  • MILLER R, SEMPLE J. Continuous positive airway pressure ventilation for respiratory failure associated with Pneumocystis carinii pneumonia. Respiratory Medicine, 1991, 85: 133-138. 15. Hill NS, Brennan J, Garpestad E, Navva S. Noninvasive ventilation in acute respiratory failure. Crit Care Med 2007; 35:2402–24. 



Fernando Acácio Batista

Fisioterapeuta Intensivista Gestor do Hospital Sancta Maggiore
Fisioterapeuta Emergêncista (ERWS)
Co- fundador e Professor da Liga da Fisiointensiva
Professor da Especialização em Fisioterapia Intensiva da Liga da Fisiointensiva
Professor do Aperfeiçoamento teórico da Liga da Fisiointensiva
Especialização em Fisioterapia Respiratória pela ISCMSP
Especialização em Fisioterapia em UTI pelo HFMUSP
Mestrando em Terapia Intensiva pelo IBRATI




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