TMI
em pediatria – Parte II
No primeiro post da série mostramos um
relato de 2 casos de lactentes cardiopatas que foram treinados de forma
distinta, mas que obtiveram êxito quanto ao ganho de força muscular
inspiratória e consequentemente no desmame ventilatório. Falemos agora sobre as
crianças maiores...
O primeiro
estudo interessante sobre a temática em questão tem mais de 10 anos e dividiu
50 crianças asmáticas em 2 grupos: GE, que realizou TMI com Treshold (Figs. 1 e
2) com carga de 40%; e GC, que realizou consultas médicas mensais com educação
em saúde baseada em orientações sobre a doença e seu controle, mantendo
tratamento clínico medicamentoso1. Os resultados são
impressionantes: o GE teve um aumento de 127% na PiMAX, 62% na PeMAX e de 80%
no PFE! Este último parâmetro traduz a efetividade da tosse da criança. Por outro
lado, o GC teve apenas um discreto aumento de 11% no PFT, não havendo aumento
significativo nas pressões inspiratória e expiratória.
Fig. 1
Em 2017 tivemos duas revisões,
sendo a primeira voltada para um tema deveras polêmico: TMI em crianças com
doença neuromuscular. O objetivo foi avaliar a segurança da técnica e sua
efetividade, visto que em se tratando desta população a principal dúvida que
nos surge é: “a imposição de carga pode acelerar a degradação proteica da musculatura
ventilatória?”. Óbvio que a resposta para tal questionamento provavelmente
depende de uma série de fatores, entre os quais a patologia da criança, estádio
da doença em que se inicia o treino, bem como intensidade e volume de treino
ofertados. A revisão encontrou 09 trabalhos, 02 deles ainda em curso. A maioria
dos estudos (6) não encontrou nenhuma melhora nos testes de função pulmonar com
o TMI, apesar de não ter sido relatado nenhum evento adverso com a utilização
da técnica2.
Fig. 2
A outra pesquisa de 2017 foi desenvolvida
por fisioterapeutas brasileiros e consistiu em uma revisão integrativa que
reuniu 17 artigos para identificar em que público pediátrico o TMI vinha sendo
empregado, além dos principais protocolos de treino. A maioria dos estudos
investigou o TMI em crianças com alguma doença neuromuscular, sendo a mais
prevalente a Distrofia Muscular de Duchenne (DMD). Quanto aos protocolos a
diferença entre os estudos foi demasiada grande. A carga inicial variou de 30 a
80% da PiMAX e a duração do treino variou de 3 semanas a 2 anos. A frequência também
teve discrepância, contudo em 8 artigos o treino foi realizado 2 x ao dia3.
Fig. 3
Por fim, ano passado colegas
brasileiros publicaram um ensaio clínico de crianças com Paralisia Cerebral,
onde randomizaram 25 crianças, sendo que 13 foram alocadas no grupo tratamento.
A metodologia empregada e desfechos analisados são dignos de louvor. O grupo
tratamento usou Treshold com carga de 30% e grupo controle fez uma terapia
simulada utilizando o mesmo equipamento, porém com carga de 5%. Ambos os grupos
treinaram por 6 semanas. O desfecho primário avaliado foi o controle de tronco,
com melhor resultado para o grupo tratamento. Também tiveram diferença estatística
significante entre os grupos os seguintes desfechos secundários: força muscular inspiratória, atividades
de vida diária, capacidade de exercício funcional e qualidade de vida, todos otimizados
no grupo tratamento4.
Fig. 4
Com isto observamos os benefícios
comprovados do TMI ainda em uma pequena população (asmáticos e neuropatas), carecendo
de mais estudos em outras patologias, bem como nas crianças criticamente
enfermas, dependentes ou não de ventilação mecânica invasiva. Em 2017 um grupo
de 10 pesquisadores taiwaneses avaliaram por ultrassonografia a espessura do
diafragma e a fração de espessamento diafragmático (FED) de crianças em
ventilação mecânica invasiva, inclusive imediatamente após a extubação. Este último
parâmetro consiste num índice obtido pelo cálculo = espessura na inspiração –
espessura na expiração ÷ espessura na expiração x 100. Este índice tem se
mostrado um parâmetro viável e acurado para avaliar o funcionamento
diafragmático e o esforço respiratório em pacientes ventilados e não ventilados.
31 crianças internadas na UTI do Linkou Chang Gung Memorial Hospital, com média
de idade de 3 anos foram avaliadas. A média do tempo de VM foi de 7 dias e do
tempo de UTI foi de 9 dias. O detalhe mais interessante do estudo diz respeito à
diferença do FED entre o grupo que obteve sucesso na extubação (23.9%) e o que falhou
a extubação (14.5%). Os autores concluíram que uma FED inferior a 17% está
relacionada a falha na extubação5.
Fig. 5
Com base em tais premissas pode-se
inferir que o TMI na UTI pediátrica pode constituir uma importantíssima
ferramenta, carecendo obviamente de ensaios que investiguem seus potenciais
benefícios a curto e longo prazo. Como instrumentos para tal temos os
resistores lineares como o Powerbreathe e o Treshold IMT, que são os
dispositivos mais apropriados para este fim, por permitirem a adequação exata
da carga instituída aos músculos respiratórios. Importante atentar para a
questão do espaço morto gerado pelo dispositivo, que como dissemos no primeiro
post não deve exceder 1.5ml/kg. Atualmente já existe resistor linear pediátrico,
com espaço morto menor, como é o caso do The Breather (Fig.3). Entretanto, não
se pode descartar a possibilidade da utilização dos incentivadores
respiratórios (Fig.4), dada a praticidade, menor custo e vantagem de feedback
visual, que para a criança pequena é essencial à adesão da terapia. O Respiron
Kids, por exemplo, além de ter a traquéia e esferas coloridas, vem com uma
cartela de adesivos que podem ser colados no equipamento com o objetivo de
facilitar a visualização da meta a ser atingida (Fig. 5). Muitos acreditam que
as evidências afirmam que o Respiron não traz resultados positivos. Na verdade,
as principais revisões dizem que os estudos não possuem qualidade científica
suficiente para provar a eficácia da terapia, o que é diferente de dizer que
possui evidência de que não funciona. Na pediatria, por exemplo, temos alguns
ensaios em crianças com anemia falciforme onde foi possível reduzir a
incidência da síndrome torácica aguda, que é a principal complicação da doença.
Isto é, a eficácia de uma terapia depende do objetivo da mesma, do protocolo
utilizado, da característica clínica da população estudada, entre outros
fatores.
Fig. 6
Outra crítica ao incentivador a
fluxo diz respeito ao fato de não se poder quantificar a carga. De fato, não é possível,
mas pode-se estimar a mesma tendo como base uma tabela de variação da carga, em
cmH2O, de acordo com o nível estabelecido no equipamento e quantidade de
esferas mobilizadas, disponibilizada pelo fabricante (Fig. 6). O modelo Kids,
por exemplo, fornece carga estimada de 4 a 20 cmH2O. Neste sentido, seria de
suma importância a realização de mais estudos com este dispositivo para fins de
fortalecimento muscular respiratório na população infantil. Enquanto isto,
ainda prefiro concordar plenamente com o amigo que possui a mais vasta
expertise em TMI no país, Dr. Mateus Esquível: “Nessa idade faz Respiron!”.
Prof. MSc. Paulo Andrade
Mestre em Doenças Tropicais
Especialista em Terapia Intensiva Pediátrica e
Neonatal
Fisioterapeuta intensivista do Hospital
Universitário HUJBB
Fisioterapeuta da UTI PED do Hospital de
Clínicas HCGV
Docente de 05 cursos de Pós-Graduação em
Terapia Intensiva
Orientador da LAFIPEN
Priscila Santos Lima
Acadêmica de Fisioterapia da UNAMA
Estagiária da FHCGV
Membro efetivo da LAFIPEN
Referências
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1.
Lima EVNCL, Lima WL, Nobre A , Santos AM, Brito LMO, Costa MRSRC. Inspiratory muscle training and respiratory
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Human A, Corten L , Jelsma J , Morrow B.
Inspiratory muscle training for children
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Woszezenki CT, Heinzmann-Filho JP, Donadio MVF. Inspiratory muscle training in pediatrics: main indications and
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Keles MN, Elbasana B, Apaydina U, Aribas Z, Bakirtas A, Kokturkc N. Effects of inspiratory muscle training in
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Lee E, Hsia S, Hsiao H, Chen M, Lin J, Chan O, Lin C, Yang M, Liao S, Lai S. Evaluation
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pone.0183560
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